Publicado originalmente

Por Debora Diniz

Ao que se sabe, e aqui repito as evidências transcritas em reportagens sobre o caso, há evidências de materialidade de estupro, algumas delas até mesmo inoportunas, como o fato de Mariana ser virgem (laudo pericial indica que o hímen foi rompido na ocasião). Importa repetir que a verdade da vítima se submeteu aos testes de veridição da polícia e do Judiciário —mas nem assim aqueles homens aquietaram-se diante da dor da vítima. Era preciso aniquilá-la em qualquer tentativa de atestar a culpa de um dos homens tão parecidos a qualquer um deles presente à cena.

 

Eu gostaria de viver em um mundo onde mulheres e meninas não fossem estupradas. Queria que a palavra estupro sequer existisse. Infelizmente, não é assim. A cada oito minutos no Brasil, uma mulher ou menina é estuprada. Se as vítimas não pronunciam a palavra “estupro” em hospitais ou tribunais é porque o medo da perseguição as emudece. E, não sem razão, nos mostrou a cena de interrogatório em que Mariana Ferrer é uma vítima de estupro confrontada em um tribunal de homens. O réu, acusado da violência sexual, é o empresário André de Camargo Aranha.

A cena é um extrato do que aconteceria entre portas nos tribunais. Com as audiências virtuais, vítima, algoz, promotor, juiz e advogado estão em um mesmo quadro. E as imagens nos fazem testemunhas do que antes seria descrito como um lamento das vítimas sobre os maus tratos do Judiciário. No extrato que assisti, até mesmo sua posição na tela é de desamparo—a única mulher, abaixo de quatro homens. Um deles a interpela com a voz do patriarca que tem o poder de mando absoluto: exibe fotos, descreve suas poses e posições como “ginecológicas”, altera a voz e a repreende nas lágrimas. Descreve sua angústia como “choro dissimulado, falso e essa lábia de crocodilo”, insinua ser Mariana uma mulher vulgar. Ele é o advogado do acusado.

Mariana implora ao representante máximo da decência—ou do justo, se quiserem—na cena: “Eu estou implorando, Excelentíssimo”, diz ela, “eu estou implorando por respeito”. O juiz pergunta se Mariana quer beber água para se recompor. O que fez o juiz imaginar que a vítima tinha sede? Talvez, um trejeito dos homens que ignoram a verdadeira dor de quem sofre. Os quatro homens da cena são matéria idêntica em confronto àquela mulher tão jovem: eles estão ali para proteger o algoz, mas também em aliança silenciosa com outros homens. São homens de poder e mando, brancos no corpo e embranquecidos nos valores, com direito à voz de mando e a quem a espoliação dos corpos das mulheres e das meninas se fez como regra naturalizada da vida.

Ao que se sabe, e aqui repito as evidências transcritas em reportagens sobre o caso, há evidências de materialidade de estupro, algumas delas até mesmo inoportunas, como o fato de Mariana ser virgem (laudo pericial indica que o hímen foi rompido na ocasião). Importa repetir que a verdade da vítima se submeteu aos testes de veridição da polícia e do Judiciário —mas nem assim aqueles homens aquietaram-se diante da dor da vítima. Era preciso aniquilá-la em qualquer tentativa de atestar a culpa de um dos homens tão parecidos a qualquer um deles presente à cena.

Houve uma divisão de tarefas, talvez silenciosa, mas tácita entre eles. É assim que se atualiza o patriarcado. Ao advogado coube a brutalidade da agressão verbal; ao algoz, o silêncio foi oportuno a um rosto escondido pela máscara. O promotor e o juiz foram os arquitetos do conluio de “estupro culposo”.

Há palavras que não se reinventam. Esse é o caso de estupro. Para os que têm dúvidas, explico: estupro é um crime de violência sexual. Em geral, de homens contra mulheres, meninas ou crianças. A vítima dos homens é sempre uma pessoa vulnerável, seja porque tem medo, porque é dependente ou porque se encontra em situação fragilizada. Não há “estupro culposo”, um neologismo de homens no poder que se arvoram inaugurar palavras e interpretações jurídicas para proteger outros iguais a si mesmos. Na fantasia patriarcal, o estupro seria “culposo” quando o agressor não teria a intenção de violentar sexualmente sua vítima ou quando ignoraria a vulnerabilidade da vítima. Para o promotor, o algoz estuprou a vítima, mas foi incapaz de discernir que ela não consentiu. Descreveu a violência como “estupro culposo”, tese que o juiz acolheu para inocentar o acusado por “falta de provas”.

Ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, descreveu as cenas do interrogatório como “estarrecedoras”, extratos de “tortura e humilhação”. Mariana expressou seu estarrecimento, se dirigindo ao juiz e perguntando “o que é isso?”. Ela estava atordoada pelo espetáculo de violência naturalizada pelos representantes do poder. É como se ela sentisse que algo de muito equivocado estivesse em curso na cena. Em uma retórica desesperada das vítimas comparou-se a outros ainda mais miseráveis expostos ao poder: “nem os acusados são tratados do jeito que estou sendo tratada, pelo amor de Deus”, disse ela. Tristemente, Mariana estava errada—ela era, sim, a acusada para aquele tribunal de homens. Como ousava nomear um deles de estupro, ainda mais publicamente? Sua ousadia seria silenciada pela sentença de inocência do algoz sob a chancela de “estupro culposo”.

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Assista ao Minicurso gravado (06 de outubro a 27 de outubro de 2020): 

Perícia Judicial em Contratos Financeiros

 

Veja comentários de quem já assistiu:

“Parabéns Professor, Equipe Técnica e Colegas Participantes. Muito bom o Curso”

Carlos Cardoso

“Obrigada, professor. Curso esclarecedor. Parabéns.”

Simara Queiroz

“Parabéns e muito obrigado. Foi um grande aprendizado.”

Gevasio Soares Gomes

“Excelente material de apoio.”

Ana Monica

“Parabéns pelo curso Prof. Alcides. Gostei muito da aula inaugural, bem básica, bem elucidativa e esclarecedora para aqueles que se dedicarão às perícias judiciais. Abre uma oportunidade ímpar aos consumidores e aos profissionais de economia. Eu mesmo estou implantando algo parecido e terei muito prazer de me aperfeiçoar com essas aulas. Creio que trabalharemos muito juntos em benefício da população endividada.”

Ogib Filho

“Excelente aula, Professor Alcides. Parabéns e obrigado.”

Peris Consultoria Empresarial​

“Parabéns. Muito obrigado. Excelente aula.”

Prof. André Stein da Silveira​

“Obrigada pelo aprendizado. Excelente curso. Parabéns ao professor e ao Cofecon.”

Christiane Alves

“Parabéns pelo mini curso professor”

Lucas Ferreira​

“O​ curso foi muito bom. um grande aprendizado”

Maria Carolina Monteiro

 

“Ótimo curso professor. Obrigada.”

Jamile Melloni​

“Bom mini curso”

Jocimar Pereira Roza​

 

“Ótimo curso”

Matheus Vagner​

 

“Obrigada”

Maria Carolina Monteiro​

 

“​Foi um bom curso. Obrigado”

Valdemar da Paixão Gomes Paixão

 

“Ótimo”

Raphael Amaral​

 

“​Excelente aula. Obrigado.”

Waldeatlas Barros

“Parabéns ao nosso COFECON por essa iniciativa em promover esse curso.”

Jucirlei Nazário

 

“Parabéns ao COFECON pela iniciativa e ao professor pela excelente aula”

Stela Balbina

 

“Curso muito bom. Professor está de parabéns pelo curso, didática e material de apoio.”

Ricardo Y2

“Excelentes explanações, especialmente pelos exemplos práticos apresentados”

José Carlos Neves de Andrade

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