Construtora terá de pagar indenização milionária após prédio de alto luxo de SP ser dado como irregular

 

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ROGÉRIO PAGNAN

A Justiça de São Paulo decidiu que um dos mais luxuosos edifícios da capital, com apartamentos estimados em cerca de R$ 16 milhões, foi construído irregularmente. Para que a instalação não seja demolida, de acordo com a ordem judicial, todo o dinheiro arrecadado com a venda dos imóveis deve ser revertido à sociedade como forma de mitigar os danos causados.

A rara decisão da Justiça paulista –e histórica pelo valor envolvido (cerca de R$ 300 milhões)– atende a um pedido da associação dos moradores do Cidade Jardim, bairro na zona oeste da capital, que desde 2012 tentava impedir a construção do prédio de 19 andares da construtora JHSF em área residencial e, após ser erguido, sua demolição.

A aplicação da “multa” milionária foi a saída encontrada pela juíza Liliane Keyko Hioki, da 1ª Vara da Fazenda Púbica de São Paulo, para não causar prejuízos “incomensuráveis” aos proprietários dos imóveis com a demolição, mas, também, não deixar impunes aqueles que “não agiram em boa-fé” e lucraram com as vendas.

“O valor das perdas e danos terá por base o montante obtido pela Aveiro com a alienação das unidades autônomas, afinal, a sanção deve corresponder às vantagens obtidas com a ilegalidade”, diz parte sentença, contra a qual ainda cabe recurso.

O município de São Paulo também é réu na ação. O prédio alvo do litígio foi construído no bairro Cidade Jardim, região do Morumbi, com apartamentos de entre 714m² e 1.815m² de área útil, com quatro a cinco suítes.

O total de área construída do prédio, segundo a ação, foi de 27.892,20 m² e gabarito de 72,16 m, proibido para uma área residencial.

Os moradores da região se revoltaram quando o empreendimento foi anunciado porque nenhum prédio havia sido construído ali, conforme prevê a lei de zoneamento.

Para erguer o prédio, segundo a Justiça, a construtora valeu-se irregularmente de benefícios criados pela lei da Operação Urbana Consorciada Água Espraiada, que incentivava a construção em regiões próximas à avenida Água Espraiada, interligação da avenida Nações Unidas (Marginal Pinheiros) e Rodovia dos Imigrantes.

Ainda de acordo com a sentença, dois órgãos chegaram avalizar a irregularidade ao afirmar equivocadamente que o terreno utilizado para construção do prédio estava 62% dentro da área compreendida pela operação Água Espraiada, e, assim, podia construir acima dos sobrados característicos da região.

Um dos órgãos foi a estatal São Paulo Urbanismo, contrariando inclusive entendimento da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Urbano. O outro foi a CTLU (Câmara Técnica de Legislação Urbanística) que não tinha competência para determinar quais eram os limites abrangidos pela lei, segundo a Justiça.

“Em outras palavras, tratando-se de situação excepcional, afinal, os benefícios da OUCAE [operação urbana] afastam a legislação comum, não poderia a administração, como o fez, atribuir os benefícios a imóvel que não se sabia com certeza e precisão se estava ou não incluídos no perímetro. Na dúvida, haveria que ser excluído”, diz a sentença.

A dúvida sobre quanto do terreno estava dentro do perímetro previsto pela Operação Água Espraiada foi dirimida pela perícia judicial determinada na ação. Chegou à conclusão que apenas de 11% a 12,4% do terreno estava dentro da área, a julgar pelos pontos iniciais da medição, distantes dos 63% exigidos por lei para pleitear as benesses da lei.

​Com a sentença a Justiça anula, na prática, os alvarás expedidos pelo município, que permitiram a construtora iniciar as obras. Além desses documentos, a JHSF alegava ter assinado um termo de ajustamento de conduta com a Promotoria, que permitiu o prosseguimento e término das obras.

O termo (TAC) foi assinado à época pelo promotor Maurício Ribeiro Lopes, que chegou a ser investigado pela Corregedoria do Ministério Público sob a suspeita de favorecer empreiteira, mas não chegou a ser punido.

Mesmo assim ele deixou o cargo na Promotoria da Habitação ao ser promovido a procurador (atua em segunda instância).

A advogada Viviane Siqueira Rodrigues, representante da associação de moradores, disse que a decisão da Justiça é importante para tentar mitigar os danos ambientais causados à região e afirma que espera que seja mantida nos tribunais para servir de exemplo

“É uma decisão muito importante porque dá ali uma mensagem de que isso não pode se fazer [construir irregularmente]. É uma resposta à altura da ilegalidade que foi cometida. Uma multa acaba por ser simbólica e nem sempre representa a importância da agressão que foi feita ao ambiente urbano”, disse a advogada, que participa de outra ação contra a mesma empresa, em discussão semelhante.

Viviane disse que é importante ressaltar que o valor estipulado pela Justiça não vai para as mãos dos moradores, mas, sim, para um fundo de direito difuso.

OUTRO LADO

Por meio de nota, a JHSF, por meio de sua controlada Aveiro Incorporações Ltda., informou que “diversos laudos de especialistas corroboraram o entendimento já emitido pela Câmara Técnica de Legislação Urbanística (CTLU) do Município de São Paulo de que o Residência Cidade Jardim está dentro do perímetro da Operação Urbana Água Espraiada”.

Ainda segundo a empresa, “o empreendimento cumpriu todas as exigências da Lei Municipal nº 13.885/04, tendo obtido todos os alvarás e licenças aplicáveis, incluindo de aprovação, construção e habite-se, sendo também objeto de acordo com o Ministério Público. A companhia apresentará todos os recursos cabíveis à decisão da primeira instância”.

A Prefeitura de São Paulo declarou que “apresentou recurso de embargos de declaração da sentença, para esclarecimentos, e, após a decisão dos embargos, serão interpostos os recursos necessários”.

 

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